pra ela voltar...

...foi há poucos minutos que me veio á cabeça a lembrança de uma pessoa... onde estou neste momento, ás duas e cinquenta e dois da manhã de quinta feira, dezoito de dezembro, posso sentir a brisa gelada desta madrugada com a janela entre aberta e uma luz colorida acesa na luminária lá da sala de belos vitrais feitos ha muitos anos atrás artesanalmente...o reflexo na parede forma uma bela flor... e ouço uma canção das que ficam na galeria das preferidas e contudo, a mais ouvida, em tecla de repetição ativada...nada mais, nenhum outro som exceto o deste teclado quando meus dedos escolhem tais letras...
ele foi gentil desde o primeiro dia em que nossos olhos se encontraram...digno de quem tem anos exercendo a mesma profissão e a mercê de holofotes diariamente ele supôs o motivo de minha presença ali naquele lugar de trabalho fisicamente exaustivo pra seu corpo...me intrigou que aquele homem pudesse ter me surpreendido apenas com a maneira de concluir e expressar sua conclusão com o olhar...
ele era e ainda é o melhor entre todos os outros...no mundo. Isso, obviamente, me faz admirá-lo e não só...me faz ter orgulho de participar de vários dias ao teu lado da maneira que podia e no tempo que sobrava entre tanto trabalho. Minhas lembranças aparecem agora, não porque o sinto como mulher mas porque o sinto como se estivesse ao telefone contando e cantando surpreendentemente o que lhe faz bem...era sempre assim, ao telefone, com o note conectado a página de letras e cifras, ora com o violão outrora com a guitarra, mas o que ficou pelo tempo guardado foi mesmo a sua voz... a profissão é outra, não é a música, mas a música o faz campeão nas horas da solidão e do entusiasmo...eu adorava, confesso que pouco do que sei sobre os campeões foi com esse moço que eu aprendi...
o campeão é o que mais procura razão para sua existência, é, por vezes, o mais amargurado em tempos de má colheita...é o mais sofrido e o mais dedicado à sua platéia, à sua torcida...ele precisa dela, do contrário não poderia ser campeão...
...vou além e relato sem que o deixe exposto, o que move multidões aos berros por seu nome... a verdade. Ele aprendeu a entregar pras pessoas a verdade simples e crua... ele disciplina o corpo e treina a mente para entregar a verdade...e ela vem, toma conta da multidão e o faz o melhor. Conviver com gente deste tipo, pré-destinada e iluminada é realmente privilégio...o campeão também entendia um pouco sobre sentimentos, sobre o amor e uma vez me mostrou uma canção... "pra ela voltar"...
ela diz:

" Desde que ela foi embora, nada mais funcionou. O galo canta muito antes da aurora, e a roupa ainda não secou. Mesma lua que brilhava lá fora uma núvem de chuva apagou. O apito do guarda noturno assopra só pra me lembrar que acabou. O muro separa o mundo lá fora. A água do poço secou. O vidro embassa se meus lábios encostam, um beijo que não me tocou.
Diga que é pra ela voltar, que sem ela eu não faço nada bem, que duas pessoas não deixam de amar,que uma pessoa só não conta que uma pessoa só não é ninguém. Escuto um barulho num silêncio que chora não reconheço esse som, não ouço o riso que ouvia outrora pois seu sorriso ela levou. Eu entro sozinho e fecho a porta, acendo a luz e não encontro mais niguém. Os móveis antigos que morrem na sala estão só pra me lembrar ...que acabou."


onde será que o campeão está neste momento com um violão ou com uma guitarra ao telefone quando o ano começa a acabar...?

e meu guardião pra me resgardar das lembranças com uma abraço de proteção e amor maior???

porque uma pessoa só não conta...uma pessoa só não é ninguém...